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corpo estranho e as imagens - aula post

Que atire a primeira pedra quem nunca sentiu aquele medinho ao receber uma solicitação de exame de corpo estranho! Sem dúvidas a pesquisa de corpo estranho é um dos maiores desafios para os ultrassonografistas e sinceramente, eu não acredito que devamos ter medo dessa suspeita, e sim respeito! A partir do momento em que você sabe as limitações da técnica, do preparo e das suas próprias características como operador, você cria respeito para com a modalidade de estudo, cria respeito consigo e gera respeito para com o tutor e com o clínico. Se prepare querido seguidoug: esse é aquele post que tem dicas até o último parágrafo, e vale assistir a aula post!


conceituando

Para começar, o que é corpo estranho? Certamente a primeira coisa que nos vem a cabeça: é um osso! é algo que o paciente engoliu e obstruiu! Enfim, vários são os conceitos que podemos encontrar na literatura e muitas são as formas de abordagens que podem ser explicadas pelos mais diversos profissionais, e isso deve-se a experiência e vivência de cada um.

Já devo dizer que, para mim, corpo estranho é mais um 'comportamento' do que um material ou localização.

Por exemplo: um cão engoliu um pequeno pedaço de osso. Num primeiro momento, esse osso pode gerar irritação na mucosa gástrica (gastrite) ou pode parcialmente obstruir o piloro. Desse modo ele está, sem dúvidas, tendo um comportamento agressivo e nocivo dentro do estômago e gerando uma clínica de corpo estranho. A medida que o processo digestivo começa a reduzir as dimensões desse osso, ele pode sim, parar de ter esse comportamento e progredir para o intestino e ser expelido nas fezes, passando então a não ter um comportamento de corpo estranho.

Corpo estranho orofaríngeo (comprimido) impedindo rebatimento da glote. Paciente atendido no Prontovet.

Isso não acontece apenas com o osso, pois atualmente vemos cada vez mais pets alimentados com "alimentação natural" como batata, cenoura, beterraba (como se fosse natural um cão ou gato escavar a terra a procura de batata, cenoura, etc, mas essa é outra discussão) e esses materiais podem sim, se ainda rígidos, parar em algum segmento do trato intestinal e gerar comportamento obstrutivo ou inflamatório. A mesma coisa pode acontecer com brinquedos, pedras, etc. Dependendo do tamanho do 'corpo estranho' e do paciente, pode ser expelido sem criar o comportamento e clínica de corpo estranho.


Algum material errado também pode ser aspirado para as vias aéreas, e promover processo obstrutivo, gerando assim comportamento de corpo estranho. Uma sonda uretral introduzida para desobstrução também pode gerar comportamento de corpo estranho, se ela se quebrar e um fragmento ficar no lúmen do trato urinário então, corpo estranho!


Como comentei, então, eu costumo dizer que o corpo estranho é qualquer material ingerido, aspirado ou introduzido que gera alteração mecânica (seja compressiva, obstrutiva ou dolorosa) do sistema ao qual ele está localizado! Essa alteração mecânica pode se apresentar em diversos graus e afetar a função do sistema ao qual está inserido.

Aqui no post vamos falar principalmente de corpo estranho de trato digestivo ok? Ao lado, um post do Instagram da @simakov.vet compartilhou um caso de corpo estranho sobrepondo o tecido testicular, introduzido de forma traumática (provavelmente).


não tão estranho assim

Em menos de 24 horas, esse corpo estranho (osso) foi quase que totalmente digerido.

Voltando ao exemplo do osso. Nossos pacientes são em sua maioria cães e gatos, animais inicialmente carnívoros e, a sabia natureza, já imaginou que se ingerissem carne, eventualmente algum fragmento ósseo poderia ser ingerido, então para eles não é impossível digerir um fragmento ósseo. Cito como exemplo um paciente que na residência, encontramos um osso (provavelmente costela bovina) de aproximadamente 5cm. Como não havia endoscopia ou cirurgia disponível naquele dia, retornou no dia seguinte e para nossa surpresa, o osso havia sido parcialmente digerido para um fragmento de pouco mais de 0,75cm, e esse processo de digestão evoluiu até que fosse totalmente expelido, incrível não?

Ainda falando da dieta dos nossos pets, por serem essencialmente carnívoros, é comum que dietas com muitos vegetais e legumes demorem mais para serem digeridos, gerando comportamento ou mimetizando o corpo estranho. Abaixo compartilho com vocês as imagens enviadas pelo sequidoug Raphaell Neto Ilha, que atua na Daniela Alípaz Ultrassonografia Veterinária (Brasília, DF).

suspeita clínica ou achado de exame?

A suspeita clínica de corpo estranho envolve vários sinais clínicos de trato digestivo: anorexia, regurgitação, êmese, hematêmese, dor abdominal... porém, nada muito específico. Vez ou outra o tutor pode falar: eu o vi comendo! Aliás, a maioria dos pacientes que atendo com suspeita de corpo estranho, não tinham corpo estranho rs.

Posso dizer sem medo: vários dos corpos estranhos que encontrei foram achados de exame (sem sinal clínico) ou não estavam incluídos na suspeita do paciente.

Corpo estranho em outras topografias além do sistema digestivo, também incluem sinais clínicos inespecíficos.


é comida ou corpo estranho

Eis a questão! Em um paciente sem jejum, ficaremos naquela dúvida constante, e como falei anteriormente: muitas vezes o corpo estranho é um achado de exame ou não era a suspeita clínica do veterinário solicitante. Nesses casos, em que não sabemos se é ingesta ou corpo estranho, o paciente deve retornar para nova avaliação, em preparo adequado. Loooogo, o que eu faço é pedir jejum de todos os pacientes, independente da suspeita clínica.


o preparo

Ah, mas a suspeita é cistite! Sim, mas e se ele também tiver uma imagem em estômago, vou laudar como comida ou corpo estranho? Então vai fazer jejum sim senhor! O jejum auxilia na identificação do corpo estranho, trás informações sobre o período de esvaziamento gástrico além de ajudar na identificação de outras estruturas. Mas quanto tempo de jejum: Depende!


Um animal adulto, 'saudável', pode sem problemas ficar 12 horas em jejum. Filhotes e pacientes com problemas relacionados a hipoglicemia sugiro que o jejum seja de aproximadamente 6 horas, sendo que as refeições que antecedem as ultimas 24 horas do exame sejam em alimento pastoso.

Agora o paciente que come alimentação "natural" (natural, sei) a coisa é diferente! Pois nossos pacientes 'carnívoros' digerem de forma mais lenta os alimentos de origem vegetal. Logo nesses casos o período de jejum tende a ser maior, e não me surpreenderia ter que solicitar jejum bem prolongado, já que eu nem sei se há estudos que falam quanto tempo esses materiais tornam-se 'não visíveis' ao ultrassom. Então nesses casos sugiro duas alternativas: ou o tutor propicia um dia de folga a essa dieta, dando ração ou alimento pastoso na ultima refeição com jejum de 12 horas, ou ele faz um jejum mais prolongado. No vídeo acima, observem a presença de um corpo estranho gástrico e conteúdo alimentar, com alguns fragmentos de legumes (estruturas hipoecóicas de formatos variados).


Hiro(toshi) meu Akita! Não é raro ele passar um dia todo sem comer. Acredito que seja por essa particularidade dos Akitas.

Uma curiosidade está relacionada aos Akitas: eles também tem o processo de digestão mais lento e você pode solicitar sem medo jejum de 24 horas.

De qualquer forma, independente do período de jejum solicitado, essa informação deve estar precisa no momento do exame, e costumo colocar no laudo, pois o período de jejum pode ser diretamente relacionado ao período de esvaziamento gástrico. Ou seja: um paciente com 12 horas de jejum (exceto Akita) que ainda contém conteúdo gástrico alimentar em quantidade moderada, já caracteriza retardo de esvaziamento gástrico.


como identificar o corpo estranho

Vamos ser realistas: corpo estranho é um trem estranho! Primeiro que eles podem ter as mais diversas formas, depende do que é! Segundo que pode ter as mais diferentes ecogenicidades, dependendo do seu material componente e sua interação com o tecido, e essa interação com o tecido é o que gera a formação de artefatos que podem auxiliar a localizá-lo.

Se o corpo estranho for intestinal, frequentemente promove alguma dilatação de segmento intestinal anterior à sua localização, isso ajuda bastante.

Como o estômago em um diâmetro luminal maior e variável dependente de sua porção, a pesquisa pode ser difícil também então uma dica que eu dou é : antes de encerrar a pesquisa, deixe o animal em estação e tente fazer a varredura do estômago com o transdutor por baixo do animal! A gravidade tende a fazer os corpos estranhos descerem e ficarem mais próximos da parede abdominal nessa posição, e assim, facilita a pesquisa!


achei e agora

Depois de localizar o corpo estranho, você deverá obter imagens para coletar uma série de informações que são de extrema relevância para o paciente. E essas informações devem estar contidas na descrição ultrassonográfica em seu laudo/relatório. Vou listar a seguir quais caraterísticas são essas e como descrevê-las, lembrando que a sequência não precisa ser obrigatoriamente essa que eu elenco, mas assim costuma ficar mais organizado


número

Os corpos estranhos podem não ser únicos e numerá-los pode ser um desafio também. Se você encontrar apenas um, descreva como 'um' mas se você tiver dúvidas da presença de mais, o ideal é citar "presença de no mínimo X estruturas"


localização

Falando em ultrassonografia, a localização deve ser a mais específica possível. Em estômago (fundo, antro-piloro ou piloro), duodeno (descendente, ascendente); Jejuno... Como jejuno é enorme e todo "enroladinho" no abdômen, em alguns casos você precisa dizer se é região epigástrica, mesogástrica ou hipogástrica, direita, esquerda ou mediana. Abdômen cranial, médio ou caudal também pode ser usado.

Já na radiografia, a localização pode ser um desafio. Lembrando que sempre é necessário a realização de ao menos duas projeções em incidências ortogonais para que a localização seja a mais precisa possível. Quando em esôfago ou estômago, eu sinto que é relativamente mais fácil citar essas localizações, o que já não acontece em intestino. Quando em duodeno ou jejuno, na radiologia é difícil diferenciar esses segmentos então costumo apenas citar que o corpo estranho é intestinal em região epi, meso ou hipogástrica direita ou esquerda. Em cólon as vezes é relativamente mais fácil afirmar que esteja ali. A presença de líquido livre abdominal pode prejudicar a adequada caracterização do segmento intestinal (incluindo cólon).


formato

Os formatos também são os mais variáveis e você pode usar formas conhecidas (arredondado, oval, piramidal, etc) ou amorfo se não apresenta uma forma conhecida.

Qual formato você usaria para a imagem da radiografia abaixo? Se você não adivinhar, ele foi removido pela endoscopia e ao longo do post você descobre.

Corpo estranho esofágico. Fonte: CEMEV.


tamanho

É necessário medir o corpo estranho, no maior eixo dele que você conseguir, e mesmo assim, pode ser que haja um eixo maior do que o que você conseguiu medir, então é necessário citar isso. Costumo dizer que ele mede no mínimo Xcm.


contornos, superfície e bordas

Os contornos do corpo estranho costumam ser bem definidos, mas algumas vezes podem ser pouco definidos ou indefinidos, como nos casos do tricobezoar. Muitas vezes é possível avaliar a superfície do corpo estranho, e se os contornos são bem definidos, a superfície pode superfície lisa, irregular ou rugosa. Se os contornos não forem bem definidos (indefinidos), não é possível caracterizar a superfície e as bordas.

Já as bordas podem ser as mais variadas (novidade né?): afiladas, puntiformes, arredondadas, etc... No vídeo acima compartilho com vocês um corpo estranho com as bordas acentuadamente puntiformes, um risco para a integridade da parede gástrica.


ecogenicidade

Aqui o bicho começa a pegar rs. Na ultrassonografia, geralmente os corpos estranhos são hiperecóicos, mas isso não é uma regra! A ecogenicidade é totalmente dependente do tipo de interação da onda sonora com o material que o compõe. Recentemente peguei um corpo estranho totalmente anecóico (um boneco de borracha/silicone, vídeo ao lado) e há relatos de colegas que indicam que esses materiais emborrachados (bolinhas pula-pula, bicos de chupeta e mamadeira, silicone, etc) são anecóicos também. No vídeo abaixo, vocês conferem um corpo estranho hiperecóico (e formador de sombra acústica), móvel na região de antro-piloro, entreamado a conteúdo alimentar e onde podemos observar outras estruturas que foram ingeridas (a "alimentação natural").


radiopacidade

Na radiologia, conseguimos identificar apenas os corpos estranhos radiopacos: radiopacidade mineral, radiopacidade óssea e radiopacidade água/fluido se, o conteúdo circundante for gasoso. Os corpos estranhos radiotransparentes podem não ser identificados, dependendo do meio em que esta inserido. Nas imagens abaixo deixo como exemplo um paciente que tinha um graveto (corpo estranho, radiotransparente) inserido na musculatura cervical (radiopacidade fluido), que gerou um contraste e o corpo estranho pôde ser identificado.


presença de artefatos

E por último, se ele forma sombra acústica, isso também deve estar descrito no relatório.


A descrição do corpo estranho em si, termina aqui. A partir do momento em que você o descreveu, alguns sinais adicionais podem ser acrescentados e estão relacionados aos tipos de agravos que o mesmo esta gerando ao órgão onde se encontra.

Por exemplo: dilatação gástrica ou dilatação intestinal anterior à localização do corpo estranho, associados ou não a peristaltismo não progressivos são achados relacionados a processo obstrutivo (íleo mecânico). Hiperecogenicidade de mesentério adjacente ao foco onde observou-se o corpo estranho, sé um achado comum de esteatite/peritonite focal. Peritonite com presença de gás (pneumoperitôneo) é um achado importantíssimo que geralmente é associado a perfuração de trato gastrointestinal ou peritonite enfisematosa.


vou exemplificar uma descrição - ultrassonográfica, ok?

Presença de ao menos uma estrutura localizada em jejuno (região mesogástrica esquerda), de formato oval, com contornos bem definidos, superfície lisa e bordas arredondadas, que mede no mínimo 0,75cm, hiperecóica e formadora de sombra acústica, com discreta dilatação do segmento intestinal anterior e posterior, parcialmente móvel aos movimentos peristálticos.


na impressão diagnóstica

Corpo estranho intestinal associado a sinais discretos de obstrução (considerar possibilidade de obstrução parcial).

clique aqui caso queira aprender mais sobre processos obstrutivos gastrointestinais

momento do exame

Nos meus laudos, independente da patologia encontrada, coloco além da data, a hora em que o exame foi realizado e no casos dos corpos estranhos isso tem um motivo especial: um corpo estranho pode mudar de lugar, pode ser expelido pela êmese ou pelas fezes ou ainda, gerar agravos (como obstrução, intussuscepção ou perfuração) que não estavam presentes no momento do exame. Então a hora é imprescindível e, é comum eu colocar a seguinte observação ao final do meu relatório: Considerando-se a característica dinâmica deste achado, sugere-se reavaliação ultrassonográfica imediatamente anterior a qualquer procedimento invasivo. E considero tanto a cirurgia como endoscopia, procedimentos invasivos.


corpo estranho linear

Um tópico só para ele, pois ele merece! E merece por ter aspectos totalmente diferentes dos que conversamos anteriormente. Corpo estranho linear é aquele que é alongado e geralmente flexível. Aqui estamos falando de linhas, panos, etc... Eles geram consequências diferentes (além do processo obstrutivo) e estão totalmente relacionadas a dinâmica do trato gastrointestinal. O peristaltismo intestinal é segmentar e quando um segmento em movimento, puxa o corpo estranho linear que também chega a um segmento que está em relaxamento, acaba gerando o plissamento intestinal ou, em casos mais graves, intussuscepção.

No vídeo acima, temos uma imagem longitudinal de segmento intestinal onde observamos o plissamento da parede (o plissamento da parede é observado no corte longitudinal intestinal). E no vídeo abaixo o corte transversal de segmentos intestinais com intussuscepção, observando-se o corpo estranho linear no centro da intussuscepção, formando imagens multicamadas com distribuição em alvo (para ler mais sobre aspecto em alvo, clique aqui).



O plissamento intestinal é um forte indicativo da presença do corpo estranho linear, e os corpos estranhos lineares que são muito finos podem não serem vistos, e vemos apenas o plissamento. Nesses casos temos um diagnóstico presuntivo, que consiste em diagnosticarmos uma patologia que não estamos vendo, mas sim vendo as suas consequências! E para isso costumo colocar no laudo, na sessão de comentários: o plissamento intestinal costuma estar relacionado a presença de corpo estranho linear.

Mas nem sempre o corpo estranho linear plissa as alças intestinais. Recentemente eu atendi um gato em que dava para observar a linha no lúmen de jejuno, sem plissamento de alça. Quando o paciente foi anestesiado e seria entubado, a anestesista percebeu que a linha estava enroscada na base da língua. Essa linha foi delicadamente puxada e era muito longa. Reavaliei o paciente após esse procedimento e, a 'puxada' da linha promoveu o plissamento intestinal.

Observe no vídeo abaixo, um corpo estranho intestinal parcialmente expelido por um gato de um ano de idade. Nesse caso o corpo estranho promovia uma intussuscepção intestinal, onde se ancorava e gerava plissamento da parede intestinal do cólon e ampola retal.

Observe nesse vídeo acima que não houve o plissamento total das camadas do cólon (sendo então uma parede corrugada). Isso ocorre porque neste segmento intestinal a camada mais externa é a camada adventícia, e não a camada serosa como a maior parte do trato gastrointestinal. A camada adventícia, composta por tecido conjuntivo frouxo comum/compartilhado com as estruturas adjacentes, é presente em algumas porções do cólon/reto e do esôfago e não possui o revestimento mesotelial, que permite a mobilidade necessária para o plissamento total de todas as camadas..


qual exame pedir?

Essa é uma dúvida comum dos nossos amigos clínicos e, eu acho que ela é comum justamente porque depende de diversos fatores. Algumas vezes o tutor tem ideia do que pode ser o corpo estranho e, conhecendo a natureza do material que o compõe, podemos indicar um exame ou outro. Os corpos estranhos de natureza mineral, óssea e metal são radiopacos e podem ser caracterizados no exame radiográfico, sendo esse então possível de ser realizado.

Outro fator que pode ajudar na indicação de qual exame ser realizado é sem dúvida, a clínica do paciente. regurgitação por exemplo, costuma estar relacionado a lesões esofágicas e portanto, a radiografia pode dar mais informações. Em caso de êmese, disquezia ou alguma outra sintomatologia abdominal, o ultrassom pode ser mais útil. Antigamente eu falava "no ultrassom pode ser mais fácil pois todo corpo estranho forma sombra acústica" mas como já vimos no decorrer do post, não é sempre assim.

Para avaliação abdominal, costumo sugerir a ultrassonografia pois muitas vezes as lesões secundárias ao corpo estranho (esteatite, reações da parede do TGI ou processos obstrutivos iniciais) são mais facilmente identificados pelos achados ultrassonográficos. Processos obstrutivos também podem ser identificados pela radiográfica (simples e contrastada) bem como processos inflamatórios quando mais severos (como efusão e peritonite, onde observamos a pera de detalhe das estruturas abdominais)

Muitas vezes, e digo muitas mesmo, a radiografia e a ultrassonografia são usadas em conjunto para fornecer diferentes informações e acabam se complementando.


e a endoscopia?

Brinquedo removido pela endoscopia esofágica. Fonte: CEMEV

Devo dizer que a minha experiência com endoscopia é pequena e muitos tutores (aqui em Campo Grande/MS) são resistentes à técnica (mas isso vem mudando nos últimos anos). Geralmente indicamos a endoscopia quando algo foi previamente visto ultrassonografia ou na radiografia e, está acessível à técnica (no máximo em duodeno). Existem várias vantagens relacionadas à endoscopia. Primeiro que ela não acaba em dúvidas se é ou não realmente um corpo estranho que estamos observando e, muitas vezes pode ser realizada a remoção sem a necessidade de procedimento cirúrgico, e isso é ótimo! O paciente pode ter alta em poucas horas após o procedimento e sem a necessidade de cuidados pós-operatórios, como curativos, dietas, etc. Além disso, a endoscopia é capaz de observar a superfície mucosa com ricos detalhes, não avaliáveis em outras técnicas.

Eu arrisco dizer que, se o tutor tem certeza que o paciente comeu algo que não deveria, em poucas horas ou minutos, o ideal já seria fazer uma endoscopia, pois polpa tempo e dinheiro do tutor.

A principal desvantagem da endoscopia é a necessidade de anestesia. Porém, se há a certeza de um corpo estranho (diagnosticado por ultrassonografia ou radiografia) e existe a necessidade de procedimento cirúrgico, se o corpo estranho é acessível e passível de remoção pela endoscopia, é muito melhor do que a cirurgia, sendo que ambos necessitam de anestesia. Abaixo dois corpos estranhos (brinquedos) removidos pela endoscopia, sendo que um formava sombra acústica ao ultrassom, e outro não. Ambos eram firmes o suficientes para serem removidos pela técnica. O Pokémon Hypno foi um caso do meu amigo (e chefinho nº.3) Diógenes de Oliveira, e o coelho com corpo humanóide foi um recente caso meu.



monitoramento

Não é incomum que precisemos fazer o monitoramento do paciente com suspeita do corpo estranho: ou porque havia ingesta no estômago e ficamos na dúvida, ou porque o tutor e o clínico querem ver se vai sair nas fezes ou na melhor das hipóteses - você tem certeza que é um corpo estranho e o procedimento de remoção (seja cirúrgico o endoscópico) será depois de muitas horas ou em outro dia , após realizado o diagnóstico. Sempre é necessário monitorar nestes casos pois o corpo estranho pode ter sido expelido (nas fezes ou êmese) ou ter deslocado para uma topografia diferente, mudando assim o local da incisão cirúrgica ou então tornando a endoscopia ineficaz ao caso.


radiografia contrastada

Com a expansão dos serviços de ultrassonografia, principalmente pela evolução dos aparelhos móveis e portáteis, as radiografias contrastadas tem caído em desuso, devido as vantagens da ultrassonografia para a avaliação gastrointestinal. Essas vantagens incluem desde a qualidade das imagens e informações coletadas até o tempo de execução (muito menor), além claro, da não exposição à radiação. Porém, em locais onde o acesso ao ultrassom é precário, a radiografia contrastada pode ser uma possibilidade e existe toda a técnica e preparo para ser realizada.

A avaliação de obstrução, presença de corpo estranho radiotransparente e o trânsito gastrointestinal pode ser feita pela administração via oral do Sulfato de Bário, um contraste radiopaco. Maaas, este contraste é contraindicado se existe a possibilidade de perfuração de algum segmento do trato gastrointestinal.

O longo prazo de aquisição das imagens, totalmente dependente do peristaltismo e transito gastrointestinal, torna as radiografias contrastadas abdominais um exame demorado e extremamente trabalhoso e, em muitos casos, não acrescenta informações muito diferentes das já obtidas pela ultrassonografia e radiografia simples. Por isso, geralmente é realizada onde não há acesso à ultrassonografia.

Agora, se tratando de esôfago, a história é outra! Esofagograma auxilia muito na pesquisa de corpos estranhos e identificação de mesgaesôfago, por exemplo. Lembrado mais uma vez que, se existe a suspeita ou possibilidade de perfuração de parede, troque o Sulfato de Bário por outro contraste positivo.


tomografia

Fonte: @simakov.vet

Eu não me lembro de nenhum paciente que tenha sido encaminhado para a tomografia por suspeita de corpo estranho e arrisco dizer que a maioria dos corpos estranhos observados nas tomografias tenham sido encontrados como achados de exame (mas posso estar errado já que não participo de nenhuma rotina de tomografia). Para encerrar nosso post, compartilho outra uma imagem divulgada no Instagram pelo perfil @simakov.vet onde é possível observar um microchip no canal medular de C4 e C5, em um gato Siberiano, atendido na Finlândia. Este é um corpo estranho introduzido de forma iatrogênica.




dicas finais

Para encerrar esse conteúdo, um resumo das dicas para a pesquisa de corpo estranho gastrointestinal, diagnóstico e descrição do corpo estranho:

1) Preferencialmente fazer o exame com paciente em jejum

2) Tentar varrer o trato gastrointestinal em sua sequência anatômica (estômago, piloro, duodeno, jejuno, cólon)

3) Procurar por sinais adicionais/sentinelas (dilatações, alterações de parede, esteatites adjacentes)

4) Monitoramento pode ser necessário

5) Se encontrou o corpo estranho, seguir uma sequência de descrição ultrassonográfica

6) Se não encontrou, ao encerrar o exame e antes de liberar o paciente, faça uma varredura gástrica com o paciente em estação



outros posts

Se você gostou deste conteúdo, precisa ler o post sobre avaliação ultrassonográfica de estômago, edema de parede gástrica e gastrite erosiva difusa! São conteúdos bem legais


agradecimentos

Preciso agradecer a todos os que colaboraram com o conteúdo deste post!!! Alguns já comentei no decorrer do texto, mas os que não foram citados (Letícia Pina, Miwa Fabiane, Raphael Rocha e Claudianara Vieira) também merecem um agradecimento especial, sobretudo em fornecerem lindas imagens radiográficas para exemplificar o conteúdo!!! Muito obrigado a todos!



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