Não é incomum que recebamos solicitação para exame ultrassonográfico abdominal e o clínico nos questiona: o paciente está em sepse?
Pois bem, para essa questão, vamos conversar sobre este assunto queridos seguidougs!
antes de tudo
Tanto você quanto seu colega clínico precisam saber que a condição de sepse é de diagnóstico clínico, pois a sepse corresponde a disfunções orgânicas que são secundárias a algum foco de grave infecção (como piometra, por exemplo) e, nem sempre uma infecção grave desencadeia sepse. E como já sabemos e sempre batemos na tecla: o ultrassom não avalia a função dos órgãos, então o diagnóstico de uma disfunção orgânica não é baseado no ultrassom, ok?
diagnosticando a sepse
O paciente que é recebido pelo clínico para atendimento, deve ser minuciosamente avaliado fisicamente, pois alguns parâmetros podem ser observados já na consulta. Os demais parâmetros das disfunções são mensuráveis de formas individuais, cada um tem seu exame específico para diagnóstico e monitoramento (quem dera se um exame só, nosso querido ultrassom, avaliasse tudo isso, não é mesmo?).
O examinador, no caso o clínico ou intensivista, deve estar atento aos seguintes sinais do paciente: consciência, pressão, movimentos respiratórios, trombocitopenia, insuficiência hepática, insuficiência renal, borborigmos intestinais e hiperlactemia. Além de avaliar estas alterações, o examinador deve fazer diagnósticos diferenciais que poderiam resultar nessas alterações, que não são causadas unica e exclusivamente pela sepse.
examinando as insuficiências
Um detalhe muito importante: ALT e FA não diagnosticam de forma alguma o grau de funcionamento hepático, elas são sustâncias que indicam lesão tecidual hepática e de vias biliares. Os marcadores de insuficiência hepática de mais fácil monitoramento clínico e laboratorial são as bilirrubinas (patologia clínica pessoal!!!). A hiperbilirrubinemia é um importante sinalizador de insuficiência hepática, uma disfunção extremamente importante que pode ocorrer na sepse. Lembrando que se o fígado está insuficiente, a bilirrubina pré-hepática que tende a subir (lembrar de diferenciar de anemia hemolítica) e em casos de icterícia pós-hepática, a bilirrubina direta sobe primeiro (sim, fui monitor de patologia clínica então me lembro bem desses detalhes!)
A hipoalbuminemia também é um indicador de insuficiência hepática.
As lesões hepáticas que vemos na ultrassonografia podem sim estar relacionadas a disfunção orgânica, mas não temos em nosso exame uma imagem patognomônica de insuficiência hepática, principalmente secundária à sepse..
A mesma coisa ocorre com os rins! O diagnóstico de insuficiência renal se dá pela azotemia e pela oligúria (<0,5ml/kg/h), e não temos na ultrassonografia modo-B uma imagem patognomônica de insuficiência renal.
onde o ultrassom ajuda?
1) foco de infecção
Para que haja a condição de sepse, um foco infeccioso deve estar instalado e a ultrassonografia é um método não invasivo e bastante sensível para a busca desse foco. Devo ressaltar que este exame não seria um FAST, pois os focos de infecção podem ser sutis e não estar relacionado obrigatoriamente a grandes derrames cavitários (foco do estudo FAST). Abscessos, piometra, peritonite, pionefrose, pancreatite necrosante, piotórax são condições que podem ser geradoras de sepse e essas condições podem ser identificadas através da ultrassonografia.
A ultrassonografia torácica (bem como a radiografia torácica) pode contribuir para um dos diagnósticos dos parâmetros de sepse: o infiltrado pulmonar. Mas como não faço ultrassonografia torácica, deixamos esse conteúdo para quem entende do assunto.
2) Avaliação intestinal
Um importante detalhe a ser observado no exame ultrassonográfico intestinal é o peristaltismo intestinal. Se você observar bem no esquema acima, com a imagem do Beagle, um dos parâmetros utilizados para o diagnóstico de sepse é ausência de borborigmos intestinais. Os borborigmos nada mais são que o som gerado pelo peristaltismo intestinal e, os movimentos peristálticos fazem parte da avaliação ultrassonográfica intestinal. A ultrassonografia intestinal é excelente para o diagnóstico de íleo paralítico!
3) diagnósticos diferenciais
Quando são encontrados parâmetros que indiquem sepse, essas alterações precisam de diagnósticos diferenciais. Por exemplo: uma hiperbilirrubinemia pode ser encontrada em um paciente com colestase, por exemplo! Uma lesão obstrutiva pós-renal pode ser causadora de azotemia e o foco obstrutivo pode ser encontrado na ultrassonografia abdominal.
Então em pacientes com hiperbilirrubinemia (se não pré-hepática por anemia hemolítica), deve ser diferenciada da pós-hepática, devemos pesquisar situações que envolvam colestase, ou colelitíases e colecistolitíases. Se você procurar aqui no blog, já temos bastante material em nossos posts.
clique aqui para acessar um post sobre as vias biliares, que pode ajudar nos seus diagnósticos diferenciais
Já em pacientes azotêmicos, devemos buscar principalmente lesões obstrutivas de vias urinárias inferiores, como obstrução em uretra e em trígono vesical. Obstrução uretral também deve ser investigada mas, quando unilateral, o rim contralateral tende a compensar a falência de seu companheiro e não gerando obrigatoriamente azotemia.
clicando aqui você acessa uma aula post sobre a pielectasia e seus diagnósticos diferenciais, que incluem processos obstrutivos
trabalhando junto
Como já sabemos, o diagnóstico, monitoramento e tratamento de sepse não é fácil, envolve muita dedicação, estudo e cooperação multidisciplinar e devo ressaltar que foi de fundamental importância a ajuda do seguidoug Henrique Augusto Souza Andrade (@cordialvet.henrique - Instagram ; Lattes), médico veterinário intensivista e cardiologista. Muito obrigado Henrique!!
Assim como busquei auxílio para a elaboração deste conteúdo: clínico, intensivista, patologista clínico e imaginologista devem estar atentos e unidos para que o diagnóstico, monitoramento e tratamento da sepse seja eficaz!
Espero que tenham gostado seguidougs!
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